@bartolomeugusmao

Bartolomeu Gusmão

A pintura de Bartolomeu de Gusmão (n. 1993, Portugal) não se revela de forma óbvia nem direta. Há algo de místico e quase sagrado nestas composições, em grandes lonas, que nos transportam para um outro lugar, de paisagens verdejantes e cenários exóticos que enchem o olhar de quem as contempla.

Seja pelo uso de stencil com tinta de spray, por pinceladas rápidas e vigorosas, ou, em contrapartida, por gestos mais delicados e demorados, alternando entre a tinta de óleo e o pastel seco, Gusmão brinca com a profundidade do campo visual, criando a sensação de que os vários planos da imagem se misturam, abolindo hierarquias e aproximando-se da abstração.

Ao deixarmo-nos seduzir pela folhagem viçosa que ilumina e enquadra toda a pintura, certos elementos quase passam despercebidos, a não ser a presença intrigante de um gato acinzentado, deitado sobre o ramo de uma árvore, da qual não se distingue nem início nem fim, e que nos fita do alto do quadro. Será esse um disfarce de Gaia? Um modo de equilíbrio e regência, transformando-se em animal, flor ou planta, habitando o nosso mundo, convivendo connosco e observando-nos? Esconde-se para manter a harmonia e revelar a paz. Assim como as flores que se transformam em borboletas e esvoaçam pelas pinturas, também Gaia se revela como mestre da metamorfose. Como explica o artista: “para os gregos natureza vinha da palavra grega phusis, que quer dizer aquilo que revela velando.

Não existem, assim, relações hierárquicas no universo pictórico do artista – apenas consonância e a experiência de uma vida em pleno. Um "Jardim do Éden”, numa interpretação homoerótica, onde corpos nus se entrelaçam e se (con)fundem com a vegetação. As figuras, por vezes delineadas através de uma silhueta, outras com leves camadas de cor e sombra, fundem-se com o verde e castanho das árvores. No entanto, não são engolidas pela fúria ou crueldade impetuosa da Mãe-Criadora, mas antes acolhidas docilmente. Um “paraíso de prazer”, onde todas as criaturas coexistem em harmonia, convidando-nos ao exercício espiritual da contemplação.

Investigação e criação de textos de apoio à curadoria: Leonor Guerreiro Queiroz