Se por um lado, o desenho surge como linha condutora na obra de Rui Castanho (n. 1986, Portugal), por outro, o pensamento pictórico está regularmente presente nas suas pinturas. Desenho e pintura fundem-se, por vezes, num só gesto, onde tudo coabita – da linguagem digital, à referência ao movimento naïf, ao cartoon, passando pela utilização da palavra aliada à imagem.
A busca contínua por uma libertação na pintura abre um campo infinito de possibilidades. As imagens que constrói resultam da multiplicidade e combinação de referências visuais, oriundas tanto do mundo real como do universo ficcionado, adulterado e digital. Que espaços são estes que, não nos sendo totalmente estrangeiros, por haver qualquer coisa de familiar que transportam, ainda assim nos escapam à identificação?
Castanho brinca com as transparências e os vários objetos do plano da imagem e a composição ganham uma nova dimensão. Não se trata de elementos bidimensionais, nem planos, mas de formas volumosas, que ocupam espaço – imagens em potência. Corpos velozes que, através do traço a lápis de cor e da trama diagonal colorida, rapidamente desenhada, transmitem a sensação de movimento.
Janelas que trespassam a superfície da tela abrem espaço e criam profundidade, convidando o espectador a olhar para lá do primeiro plano. O olhar atravessa o interior sombrio do que parece ser uma antiga carruagem de um comboio, marcada pelo tempo, manchada pelo grafitti e iluminada com o vislumbre de cenários coloridos e impercetíveis, do “lado de lá”.
Existe uma certa ideia de distância entre o observador e o que se encontra dentro dos quadros. Frondosas copas de árvores revelam uma figura de luz, que senão fosse pela roupa branca que veste, quase se confundiria com o plano verdejante e denso por detrás. Num outro plano, o espectador surpreende-se ao sobrevoar uma paisagem noturna, pontuada por pequenas luzes que lembram a vista aérea de uma cidade iluminada durante a noite, como da janela de um avião. Terá sido essa a sua posição, quando Castanho pintou esta imagem? Ou terá recorrido à tecnologia, à utilização de um drone para a construir? Ou terá sido, antes, o resultado de uma confluência de memórias?
Investigação e criação de textos de apoio à curadoria: Leonor Guerreiro Queiroz